segunda-feira, 31 de outubro de 2011

(Mini-Crônica): Bate papo

- Tudo bem. E você, como tem andado?
(...)
- Sei como é isso. Minha esposa, quando estava grávida, vivia reclamando desses enjoos. Principalmente nos primeiros meses...
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- Não, depois não piora não. A tendência é melhorar, com certeza. Até diria que há três fases na gravidez, pela minha pouca experiência, mas é impossível generalizá-las a todas as mulheres...
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- Não se preocupe. A Lívia vai passar pela segunda fase...
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- Te explico. A primeira fase são os primeiros meses, talvez um, talvez quatro. Não sei. Com a minha durou menos de três. É quando aparecem os enjoos e mudanças mais radicais de humor. Afinal, é quando ela está entrando na aventura de ser mãe. Tem muitas mudanças internas. Há o medo maior da sobrevivência do embrião. Então deve-se entender que é uma fase que você deve agir com cuidado e paciência. A terceira fase é praticamente todo último mês da gestação, ou seja, pode ser o sétimo mês ou o oitavo mês, normalmente. É um mês de muitos incômodos com certeza. Ela estará inchada, grande e indisposta e pode estar levemente deprimida e com muito medo também. Também temos de ter paciência e estar disponíveis,...
(...)
- Isso mesmo. A segunda fase é o resto. No meu caso, ficou entre o começo do terceiro e começo do oitavo mês. A segunda fase foi muito agradável, em todos os sentidos. Não sentimos falta de nada nesse período e curtimos muito aqueles momentos. Então tenha paciência que vocês terão esse período relax também...
(...)
- Sim, fomos ao aniversário da Talita. E não fique chateado se ela não te convidou. Acho que é porque não conhece a Lívia. Eu mesmo só fui porque ela conhece a Bete há muito tempo. E só tinha cerca de dez pessoas. Mas, ela preparou um jantar muito gostoso e a própria fez o bolo. Olha, se fosse casada, com certeza o cara seria obeso, a não ser que lhe desse uma canseira em outras regiões da casa...
(...)
- Tem razão. Aquela não sabe nem o que é isso. Talvez até saiba, mas só de ouvir falar. Ela lê romance, assiste filmes com casais se amando, vê uma cena aqui outra ali, mas acho que aquilo tudo entra por uma orelha e sai pela outra. Nada, no que tange a relacionamento ou algo que o valha, faz morada em sua cabeça. É lisa como um bagre ensaboado, escorrega que é uma coisa quando o assunto vai por esse lado, mesmo que a estória não seja com ela...
(...)
- Sei lá porque! No seu aniversário eu fiquei procurando um presente. Uma lembrancinha. A Bete me encarregou disso. Um saco! Aí passei por uma lojinha, dentro de uma galeria perto do trabalho, e vi na vitrine uma peça decorativa de vidro, incrustada em uma pedra sabão. No vidro tinha uma inscrição em caracteres chineses que diziam significar "muita paixão". Pensei "não tem nada a ver com ela", mas era bem bonitinho, estava atraso. Mandei embrulhar e levei...
(...)
- Pois é! Achei que ela abriria o pequeno pacote, diria obrigado, e, depois que nós saíssemos, daria uma sumiço naquilo. Então, quando ela abriu o pacote, viu os caracteres, eu disse a primeira coisa que me veio à mente: "É isso que te desejo para esse novo ano de vida que se inicia"...
(...)
- Ahhh! Ela, que apesar dos trinta e cinco anos que estava completando, era mais inocente que qualquer moça de quinze anos de hoje em dia, me falou candidamente: "Ah! Você sabe que eu nem penso em me casar!".
(...)
- Eu já fui com os dois pés no peito: "Talita, não é isso que estou te desejando. Estou te desejando 'muita paixão'". E ela ficou sem entender. "Ora, e pra casar não precisa de paixão?"
- Falei, "claro que não, é o que menos necessita. Talvez é melhor nem ter. Para casar é necessário cumplicidade. Casamento, talvez, seja uma coisa mais para a sociedade, um compromisso para com a humanidade. Ao casar dizemos ao resto dos humanos, 'olha nós pretendemos cumprir com nosso compromisso de perpetuar a espécie e cuidar bem dos rebentos que podem vir'. É isso, em essência, o casamento..."
(...)
- Sei. É muita elocubração para a Talita, coitada. Nem sei o que me deu ficar polemizando com uma pessoa que não deseja problemas, só isso. Mas, eu não fiquei contente...
(...)
- Isso mesmo. Aproveitei que a Bete não estava por perto e completei, "digo que é melhor nem estar apaixonado para se casar. Apenas a cumplicidade é exigida. Ambos devem ser coniventes em tudo e sabedores do que pode acontecer ou já aconteceu, que, basicamente, é a finalidade do casamento, ou seja, dar um lar aos filhos. A paixão não suporta isso. Ela, pelo contrário, pede exclusividade. É dos sentimentos mais egoístas. Deseja suprir seu desejo e não imagina dividi-lo com ninguém. Assim, se o desejo é se apaixonar, melhor é cada um ficar em um canto, a imaginar, a sonhar, a desejar, a realizar com sofreguidão e depois desejar mais, ansiosamente, uma nova oportunidade..."
(...)
- E aí que ela ficou pensativa, sem resposta. Demorou longos segundos. E, amigo! Parece que vi nascer outra pessoa ali. Ficou toda sorridente. Deu-me um beijinho. Agradeceu o presente, disse, "vou colocar em um cantinho especial, onde eu sempre o possa ver, e lembrar-me de nossa conversa."
(...)
- Tem razão. Acho que soltei a Talita da jaula. Coitado de quem passar por perto.

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