terça-feira, 5 de agosto de 2014

(Mini-Crônica): Uma música diz tudo?

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Existe essa coisa de "nossa música"? Isso ainda seduz alguém?

O que fiquei sabendo foi algo diferente. Não se tratava de "nossa música". Porque, para essa pessoa, sequer houve o "nossa", apenas a música.



Mas aconteceu uma vez para ele. Há vários anos.

Naquele dia ele confessou a ela algo muito inusitado. É que uma música representava muito bem aquilo que sentia por ela, a ponto de não haver nada mais a dizer a respeito. Apenas a letra da música já era suficiente, era aquilo que gostaria de dizer, aquilo que deveria deixar registrado, aquilo que ela teria de ouvir dele estava lá, como se houvessem feito para isso.

Acreditar em destino não era seu forte. Gostava de sentir-se meio que dono de suas ilusões, de seus pensamentos e desejos, e muito mais daquilo que poderia acontecer em sua vida. A música em questão foi lançada em 92, e a conheceu muitos anos depois, não havendo qualquer relação de causa-efeito nisso, apenas um amadurecer no entendimento de como se sentia.

Na verdade foi tudo uma imensa coincidência, como devem ser as coisas boas da vida. O compositor, talvez conhecesse alguém, por quem teria o mesmo tipo de sentimento que ele tinha por ela? O mesmo descompromisso, a mesma disposição de manter tudo desse jeito, para sempre? A mesma falta de necessidade de avançar, de ter mais? Na verdade, a mesma desnecessidade de possuir?

Nem procurou confirmar tal pensamento.

Mas, não é que não existia o desejo, não é isso, é apenas o fato de que, se nada acontecesse; e nada deveria acontecer, e nada, de fato, aconteceu; tudo bem, seria bom também, não há o que se lamentar. E se alguma coisa acontecesse, também seria bom, não se descarta nenhuma hipótese, apenas não precisa ser assim.

A música tem o título: "Apenas mais uma de amor", porém, não necessariamente estamos falando sobre uma declaração de amor.

E ela começa dizendo: "Eu gosto tanto de  você, que até prefiro esconder". É assim mesmo, ele gostava muito dela, mas preferia que ficasse escondido, pois não sabia se poderia suportar, tanto uma recusa dela, como um esfriamento diante das impossibilidades de algo acontecer. Além disso, e se não fosse nada disso, ou seja, se não foi o caso de querer que algo acontecesse?!

Depois vem: "deixa assim ficar subentendido". É preciso que ficasse subentendido, pois assim não teria como quantificar a coisa, nem como qualificá-la. Poderia ser muito menos do que pensava, poderia ser muito mais, poderia ser apenas uma amizade diferente, poderia ser uma paixão arrebatadora, então, era melhor deixar subentendido.

"Como uma ideia que existe na cabeça e não tem a menor pretensão de acontecer". Tem toda razão o verso. É mesmo só uma ideia que existia lá na cabeça dele, não precisava sair de lá, não tinha qualquer obrigação de acontecer. E se saísse e não acontecesse, o que se ganharia com isso? Na verdade, pensava, poderia era perder, e muito. Perderia a própria ideia, e perderia todas as possibilidades do que poderia ser. Às vezes, é melhor ficar somente com as potencialidades.

E prossegue: "Pode até parecer fraqueza, pois que seja fraqueza então". Ele chegou a essa conclusão também, é uma fraqueza. Sim, de fato que é. Fraqueza de sentir, de ser tão vulnerável por nada. Nada lhe foi dado, nada lhe foi prometido, sequer um olhar. E é mais fraqueza ainda por não querer sair disso, por querer ficar sempre subentendido. Ora, pois que seja fraqueza então!

E o melhor de tudo: "A alegria que me dá, isso vai sem eu dizer". E que alegria lhe dava, que alegria de poder ter tal sentimento dentro de si, e apenas acreditar nele, acreditar e saber que poderia ficar lá parado e nada pagar por isso, nenhuma penalidade, somente o beneficio de tê-lo consigo.

E ainda diz: "Eu acho tão bonito, de ser abstrato baby". Ele também achava divina essa faculdade humana, a de se abstrair, poderia ser abstrato e ninguém saberia do que estava falando ou sentindo, ninguém que não tivesse a mesma chave que ele criou. Aqui o autor da letra lhe passou a sua chave e ele foi capaz de retirar a abstração da música.

E "se amanhã não for nada disso, caberá só a mim esquecer. O que eu ganho, o que eu perco, ninguém precisa saber". Fala por si...

Realmente não foi nada disso, e  não está sendo nada disso, mas ele confessou-me que ainda não lhe cabe esquecer.

Infelizmente, a sutileza disso tudo, sua abstratividade e seu sentimento não foi captado. Não houve troca da chave reveladora, mas tudo ainda permanece assim, obscuro.

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