quarta-feira, 22 de junho de 2011

(Mini-Crônica): Na alça de mira

Poderia ter se virado. Mas não, optou por ficar ali, sendo observada. "Na alça de mira", diria seu avô, sempre conturbado pela violência que dominava o lugar.

Mas o risco que corria não era de morte. Muito pelo contrário. Seu risco era de vida, era de liberdade. Para muitos uma benesse, para ela uma escuridão. Portanto, totalmente apavorante.

Então, não sabe porque, ao invés do costumeiro esconderijo, onde sempre procurava refúgio em seus momentos de ócio, optou por ficar ali, sendo vista por todos, como uma peça de carne, disponível, fresca ainda, no seu caso, totalmente fresca e intocada.

Não se sentia disponível. Apenas quis testar. Se existia. Se atraia olhares. Se poderia ser desejada, quem sabe? Apenas ter motivos para justificar seus próprios pensamentos. Coisas que apenas revelava a si própria, Coisas do tipo: "Eu não quero, prefiro ser sozinha."

Será que havia essa preferência? Ou não dependia dela. Muito pelo contrário.

O fato é que, no primeiro minuto que ajeitou-se naquele lugar, surgiu aquele sujeito, com uma bandeja na mão, perguntando se poderia dividir com ela a mesa, já que todos os lugares estavam ocupados. Gostaria de dizer que era alto, barba charmosamente por fazer, pele queimada de sol, olhos claros e sonhadores, e tudo o mais.

Mas, não. Era um sujeito nem baixo nem alto, nem loiro nem moreno, nem gordo nem magro, nem nada nem tudo. Era alguém que ela bem poderia tropeçar porque não o havia enxergado. Alguém que se confunde com a paisagem. Alguém que bem poderia estar ali há muito tempo, e ela não havia notado. Alguém que ela poderia ter conhecido no passado, no colégio, na faculdade, mas que não havia criado massa crítica em sua mente, para que fosse recriado em sua memória.

Pior que isso, ele obstruiria a visão que teriam dela, pois, atrás e ao lado do lugar que havia escolhido, somente havia paredes. Não sabia se teria coragem ou desejo de se expor assim de novo, mesmo que a 50%. Então respondeu: "Desculpe-me, estou esperando alguém."

"Então! Chegou esse alguém. Eu!"

Sua ousadia foi tão repentina. Sua cara de pau foi tão surpreendente. Havia uma pretensão de certeza, que confirmou suas esperanças, havia uma segurança de conseguir, que segurou seu olhar, havia um desejo de agradar, que deu causa a seu sorriso.

Ele havia chegado mesmo, era ele. Não havia mais ninguém. O seu manto de invisibilidade caiu.

Foi a partir daí que iniciou sua vida. Mas, não se lembra mais seu nome.

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