segunda-feira, 3 de junho de 2013
(Devaneio): Ostra feliz não faz pérola, de Rubens Alves
Estou terminando de ler um livro. Uma surpresa, porém não inesperada. Comprei-o meio sem querer, depois de muito tatear por outros nas estantes da livraria e era chegada a hora, ou de comprar algum, ou ir embora, voltando ao meu enfado diário.
Já conhecia o autor de longa data, embora, quando tive primeiro contato com sua literatura, não tivesse atinado àquela percepção de mundo. E é essa concepção de ciência, de religião, de filosofia que me acompanha desde o primeiro ano de faculdade, quando utilizei seu livro "Filosofia da Ciência - Introdução ao jogo e suas regras" (Brasiliense, 1981) no rápido e burocrático curso de Introdução à Metodologia Científica.
Tinha somente 18 ou 19 anos à época, um ano mais jovem que meu filho é hoje, mas cheio de convicções, de idéias superdimensionadas sobre mim mesmo e meu futuro, então não posso culpar-me por não lembrar os ensinamentos que porventura tenha captado daquele pequeno tomo.
Mas, bem depois, com o segundo livro que li do autor, o meu reconhecimento e admiração se firmaram. Foi com "Variações sobre o prazer" (Editora Planeta, 2011) que se consolidou minha paixão. Ainda não consegui impunemente buscar somente o prazer, como ele diz, talvez por estar demasiadamente impregnado, por um lado, dos dogmas cristãos de uma educação passada, e, por outro lado, o de tantos desejos luxuriosos. E o embate dessas duas criaturas dentro de mim acaba por provocar uma estagnação de meu ego, a espera de uma resolução, que sei, nunca acontecerá.
Tenho inveja dele. Como de tantos. Fico feliz que é uma inveja não no sentido pecaminoso, mas apenas por não encontrar outra palavra superlativa para essa grande admiração. Minha alma se encontra com muitos escritores, embora não com eles, especificamente, mas com seus escritos, com suas composições, com seus insigthts, impossíveis de ser alcançados por mim, de forma independente.
Agora estou sorvendo o seu "Ostra feliz não faz pérola" (Editora Planeta, 2012). Magnifico. Um mundo de delicias. Cada trecho, cada pequeno vidrinho de seu caleidoscópio vale por uma citação. Irei apresentar apenas uma neste post. O resto deixo para a curiosidade daqueles que desejam se embrenhar na filosofia de Rubem Alves,
Como não poderia deixar de ser, pois o autor tem formação em teologia, seus textos são repletos de citações e pensamentos de cunho religioso, embora não se identifique qual a denominação que predomina. Temos os ensinamentos cristãos como maioria. Para aqueles que não se identificam com tais coisas, eu não citarei trechos que se aprofundem essas idéias, mas somente um pensamento que ilustra aquilo que eu também penso e advogo. Aliás, depois que decidi parar de escrever produtivamente, percebi que passei a ser amante de idéias e citações de outros, no melhor estilo do "nada se cria, tudo se copia".
Mas, não se trata de cópia, propriamente dita, mas sim de seguimento, de homenagem de alguém que se deseja discípulo, tão somente.
Vejamos uma idéia sensacional sobre o que é crer em Deus e, ao mesmo tempo, o que é a dúvida sobre o vazio, a questão da gnose. Encontro à página 208 desse "Ostra feliz não faz pérola":
A casa
Três homens conversam. Assentados, olham para o horizonte. Um deles diz: "Vejo uma casa e dentro dela vejo um homem". O outro diz: "Vejo a casa, mas não vejo nenhum homem dentro dela". Um terceiro comenta: "Não vejo a casa. Não vejo um homem. Só vejo o mar imenso, sem fim ...". Assim são os três. O primeiro é o que vê uma Presença habitando os espaços invisíveis do universo. Acredita em Deus. O segundo vê os espaços invisíveis do uiverso, mas não encontra neles nenhuma presença. Eles estão vazios. A essa pessoa dá-se o nome de ateu. Porém, que nome dar àquele que não vê os espaços invisíveis do universo, mas apenas o mar misterioso, ao longe, mar para o qual caminha, mar que haverá de se tornar... Que nome lhe dar? "Com que tristeza o horizonte avisto, aproximado e sem recurso! Que pena a vida ser só isso..."(Cecília Meireles)
Então, para mim, o livro foi como encontrar um recinto de espelhos e abismos. Em um dado instante vejo-me refletido em toda minha beleza e feiúra. Vejo ser apresentado aquilo que, em essência, mais acredito e gostaria de expressar, mas que, por não desejar "reinventar a roda", não me sentia capaz de demonstrar. Porém, às vezes na mesma página, o livro é um abismo, que não consigo me desviar, tenho que trilhá-lo, mesmo sabendo que nunca chegarei àquilo que desejo de verdade.
Bom! Enfim! Leitura recomendada!
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