segunda-feira, 23 de maio de 2016

(Pensamentos): Discussão vazia



Nesses tempos de intolerância é preciso que me posicione sobre alguns assuntos, a fim de preservar um pouco minha integridade física e mental e conservar algumas amizades que ainda julgo relevantes ou mesmo necessárias.

Um dos balizadores de minha convivência social atual é evitar a todo custo (até fugir) entrar em discussões vazias.


E o que eu, para meu próprio uso (sem qualquer rigor filosófico), defini como "discussão vazia"?

Para mim uma discussão vazia não tem correlação com o assunto que se está conversando, mas com o perfil das pessoas que estão conversando, e dos expectadores da conversa.

Eu sei que uma discussão será vazia quando tenho como opositor (entendendo-se opositor como aquela pessoa que estou entrando em debate, não um inimigo, no sentido estrito da palavra) uma pessoa que demonstra dois tipos de comportamento ou característica:

a) É um opositor sistemático, ou seja, ele, por definição ou por filosofia de vida, se opõe àquela ideia ou grupo de pessoas ou linha de pensamento objetos da discussão. Ou seja, é uma pessoa que, somente a possibilidade de aceitar algo que venha ou o leve ao encontro dessa linha de pensamento, já significaria uma traição a tudo que lhe foi ensinado ou a todas as conclusões e premissas que balizaram sua vida, tornando-a, por assim dizer, uma falácia sem tamanho. Assim, um opositor sistemático, sob risco de entrar em parafuso existencial, nunca aceitará nada que possa afrontar suas premissas.

b) A rigor, não deseja encontrar uma solução ao problema objeto da discussão, mas tão somente tecer argumentos e apresentar evidências à sua própria convicção ideológica, a fim de justificar, a si mesmo e aos outros, sua oposição sistemática. Ou seja, sua intenção é retroalimentar suas ideias.

Um exemplo fictício que poderia apresentar e que exporia minhas convicções sobre o assunto, seria como entrar em uma discussão sobre o Papa Francisco.

Para mim, seria trabalhoso tal debate, pois sou um opositor (não sistemático) da ideologia Católica, e bastante opositor da ideia de um Papa, mas, sou favorável a boa parte das mensagens do atual chefe do Catolicismo, o Papa Francisco, um homem que me parece com grande sabedoria de vida.

Porém, um debate onde uma pessoa se mostrasse um Católico extremado, com petrificadas decisões sobre sua ideologia religiosa, principalmente considerando-a como a única a explicar o Cristianismo, e que relacionasse os aconselhamentos do Papa Francisco a essa concepção, seria solenemente ignorado por mim. Viraria as costas a ele talvez antes de entrarmos em debate, pois não seria possível qualquer troca de ideias entre nós.

Hoje passei por um perrengue desse tipo em meu local de trabalho, espaço notável de pessoas opositoras sistemáticas ao governo que se instalou a partir de 2003, por eles chamado de "Lulopetismo".

Não sou adepto dessa oposição. Talvez, em algumas situações, eu me considere um opositor ferrenho às políticas adotadas e, outras vezes, sou até um entusiasta defensor, mas nunca um opositor sistemático.

O assunto que estava na conversa era outro, mas, de repente, como é de praxe no local, alguém "pescou" um motivo para falar contra o Governo. Naquele momento, o tema que se encaixou, foi o programa "Ciência sem Fronteira".

Sou a favor da ideia do programa. Entendo como, de fato, a única atitude efetiva, criada por um governo brasileiro, que dá oportunidades de internacionalização dos estudantes do país, algo tido como essencial nos dias atuais. Aliás, essa característica é uma das mais prestigiadas hoje em dia por analistas da qualidade de universidades ou mesmo da educação superior em um país. A internacionalização é essencial para sanar nosso subdesenvolvimento científico. Ela está intimamente ligada à melhoria da qualidade de nossa mão de obra e pesquisa científica.

Entendo que há erros na concessão e na conduta de um grande número de estudantes que foram beneficiados com o programa, notadamente também que, nesse momento, foram concedidas muitas bolsas a quem não precisaria dela ou não fez bom uso.

Porém, meus colegas, opositores sistemáticos, nunca poderiam encontrar qualquer virtude em um programa desse tipo, partindo do "Lulopetismo", e buscavam enaltecer suas falhas, generalizando-as.

Ora, se um jovem foi beneficiado com o programa, sendo de uma família que, provavelmente, poderia pagar o estudo no exterior, mas obteve a bolsa para uma graduação-sanduíche de má qualidade, que lhe permitiu fazer turismo pela Europa, então o programa deve ser cancelado imediatamente, pois todos conheciam ou ouviram falar de casos iguais, assemelhados ou piores. Ou seja, é uma "discussão de pescoçudos", onde todos ficam balançando afirmativamente a cabeça enquanto um relata um caso, apenas esperando para começar a contar seu próprio caso.

Como não tenho qualquer situação negativa a relatar e, mesmo que tivesse, ainda apoiaria o programa,  apenas utilizaria esses casos para pleitear uma reforma de procedimentos, pois, são falhas de comportamento de pessoas que aproveitaram brechas. Revela, na verdade, o grande desvio moral de nosso povo, principalmente nas classes mais abastadas.

Retirei-me da discussão imediatamete, assim que o primeiro relato iria ser iniciado. Mal pedi desculpas e virei as costas.

Melhor assim. Senão iria entrar em uma discussão vazia, com grandes chances de perder definitivamente minha paz naquele local.

Melhor atrasar ao máximo esse momento.




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