segunda-feira, 6 de junho de 2016

(Pensamentos): Sobre um assunto de meu interesse


Há alguns dias, após cerca de 6 meses que o projeto foi apresentado, a Câmara dos Deputados decidiu votar os Projetos de Leis (PL's) que tratam, entre outros assuntos, do reajuste salarial de diversas categorias de servidores do serviço público federal.

Dentre esses PL's, havia o PL 4254/2015, que me interessa pessoalmente, pois contempla o acordo que, a duras penas, conseguimos celebrar em 2015.



Na visão de qualquer dirigente sindical do setor privado, trata-se de um péssimo acordo, pois esquece as perdas de mais de 30%, acumuladas desde julho de 2010, data em que conseguimos um reajuste que encerrava também mais de 10 anos de perdas acumuladas. Essas perdas se consolidaram ainda mais com a inflação acima de 10% verificada em 2015 e nem computa totalmente a provável inflação de 7% para 2016.

Além disso, o acordo congela os reajustes para os próximos 4 anos (incluindo 2016), confiando que, nesse período,  inflação não passará de cerca de 24% (já computando os 7% de 2016).

Porém, a imprensa pegou pesadíssimo em cima da aprovação do acordo, de forma que, muito provavelmente, ele não passará pelo Senado ou pela sanção presidencial.

Um deputado, Flavinho do PSB, apresentou voto em separado, por escrito, em forma de protesto. O teor do seu voto pode ser lido pelo link: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2076251.

Decidi encaminhar e-mail diretamente para o deputado, na tentativa de fazê-lo ver que o assunto não é tão simples como parece e que o Governo Federal, entre tantas atribuições, também deve ser visto como patrão e assim assumir suas obrigações patronais. Além do que, o cumprimento do acordo em si, não é tão (na verdade, bem menos) maléfico à sociedade quanto a pretensa economia que inadvertidamente divulgam, que seria utilizada, a rigor, para nada (esterilizando os recursos) ou para pagamento de juros a banqueiros e investidores institucionais.

O teor do e-mail que enviei foi:

"Excelentíssimo senhor Deputado Federal Flavinho,

Li a sua declaração de voto, apresentada quando da votação dos PL’s referentes a aumentos salariais para diversas categorias de servidores da União.

Achei oportuna e corajosa a manifestação de sua opinião quanto ao assunto, mesmo sabendo que talvez não influenciasse a decisão final.

Porém, como servidor público federal, gostaria de tecer alguns comentários sobre o teor de sua declaração e peço o especial obséquio de sua atenção.

V.Excia. julga inoportuna qualquer deliberação sobre o assunto, haja vista o País atravessar grave crise econômica que ceifou, entre outras coisas, o emprego de 12 milhões de brasileiros. Segundo vosso entendimento, tal assunto deveria ser discutido somente no momento em que se revertesse a crise, quando a economia do País voltasse a apresentar números positivos.

Sendo assim, em outras palavras, V.Excia. pede, senão diretamente, mas indiretamente, que os servidores públicos permaneçam sem reajuste salarial pelos próximos anos, sem garantia de prazo. Ou seja, em um momento oportuno, mas incerto, em vosso entendimento, poderia voltar-se a discutir um reajuste, sem mencionar em que base se daria tal reajuste.

Peço encarecidamente que V.Excia tenha em mente o teor do assunto e sua história, pois somente assim é que podemos traçar um melhor julgamento.

Falo pelo PL 4254/2015, do qual a minha categoria faz parte. Tal PL é fruto de negociação difícil e conturbada, levada a termo durante todo ano de 2015. Seus reflexos já estão previstos na peça orçamentária de 2016, ou seja, não acrescenta valores ao propalado déficit, que, uma hora dizem ser de 100 bilhões de reais, outra hora fala-se em 150 bilhões de reais e agora em 170 bilhões de reais. Ou seja, seja lá qual for a medida do déficit, a implementação desse acordo já está computada desde o princípio.

Também é importante mencionar que o teor do acordo seria algo que qualquer dirigente empresarial desejaria. Inicialmente, observa-se que os servidores contemplados por esse acordo amargam defasagem salarial de cerca de 32% desde jul./2010 (data do último reajuste dado pelos acordos feitos no Governo Lula em 2008, sendo que, após 2010, a Presidente Dilma concedeu reajuste de 15,76% em 2013, pagos em três parcelas anuais de 5%, encerradas em 2015) até o presente momento, com base no INPC.

Assim, hoje, um servidor dessas categorias contempladas pelo PL, ganha, em termos reais, cerca de 75% do que ganhava em jul./2010. Tal defasagem, pelo acordo em comento, nem foi discutida, sendo esquecida, deixada para trás. Adicionalmente, o acordo congela os reajustes para os próximos quatro anos. Apenas isso já seria comemorado por qualquer dirigente privado. Além disso, o primeiro reajuste (previsto para ago./2016) é de 5,5%, para uma inflação acima de 10% em 2015 e cerca de 7% em 2016. O segundo, de 6,9%, a ser dado em 2017, e o terceiro e quarto, de 6,3%. Nada mais, nenhum novo benefício, nenhuma vinculação de remuneração foi estipulada por esse acordo.

Ou seja, os servidores públicos deram um voto de confiança nas políticas governamentais para os próximos 4 anos. Trata-se então de um acordo bem vantajoso para o lado patronal, que é o Governo Federal.

Senhor, é importante que se diga que, logicamente, qualquer aumento salarial dado aos servidores públicos serão pagos pelos cofres públicos e, por extensão, pela sociedade. Não poderia ser diferente, pois é o Governo e a Sociedade que são os patrões.

Dessa forma, os acordos salariais, sendo razoáveis (e o presente acordo é mais que razoável), deveriam ser levados em melhor consideração.

Outro tópico que gostaria que fosse levado em consideração por V.Excia. é a própria questão da crise pela qual o País passa. Respeitosamente discordo da afirmação de que tal crise venha de longa data, mas sim de meados de 2014 para hoje. A causa do seu aprofundamento é que é de longa discussão. No entanto, pode-se dizer que a questão principal é a queda de confiança dos agentes econômicos internos e externos no destino que se dará ao País. Há uma insegurança jurídica e econômica que trava investimentos produtivos e que paralisa o Brasil. No atual cenário, todos esperam para ver, não renovam ou celebram contratos e adiam decisões de aportes de recursos. Com isso, a cada dia, obras e empreendimentos são paralisados e empresas, que prestavam serviços ou viviam no entorno desses empreendimentos, são fechadas, gerando um ciclo vicioso de desemprego.

Sendo assim, os servidores públicos estão longe de ser culpados pelos atuais problemas. Pelo contrário, com a queda da renda da população, aqueles que se veem sem condições de honrar com compromissos com escolas particulares, planos de saúde, empréstimos e financiamentos diversos, buscam os serviços públicos, sobrecarregando-o ainda mais.

Ademais, a queda do poder aquisitivo dos servidores públicos só agrava ainda mais o problema. Hoje, como disse, um servidor das categorias contempladas no PL ganha, em termos reais, 75% do que ganhava em jul./2010. Com isso, é claro, reduziu seu consumo em patamares semelhantes. Pela proposta do Deputado, com congelamento de salário a perder de vista (o Deputado não estipula prazo para uma revisão ou patamar para essa suposta revisão), a perspectiva de não ter aumento em 2016, 2017, 2018, ... o que acarretaria? Logicamente, mais queda de consumo, com dispensa de tudo que não for essencial, entre elas, empregada doméstica, serviços de estética (como cabeleireiros e manicures), educação não essencial (como cursos de línguas para filhos), alimentação fora, etc. Tudo isso, dada a elevada inserção do servidor público em sua comunidade, aumentaria o ciclo do desemprego, levando a mais recessão.

Então, Deputado, tal decisão, a saber, o pretenso congelamento salarial de servidores públicos sine die para solução, poderia atrapalhar ainda mais uma desejável retomada de crescimento econômico, haja vista que não se sabe qual seria a utilização da provável economia gerada pela medida. A bem da verdade, seguindo a linha de pensamento neoliberal, tal economia nem seria utilizada pelo Governo, mas serviria para reduzir o déficit do orçamento. Ou seja, a elevação do ciclo de desemprego citada no parágrafo anterior não teria medidas compensatórias por qualquer política governamental.

A meu ver, é importante que se diga também que, um congelamento salarial, somente é justificado se a empresa em questão sofre risco de continuidade de existência, caso conceda reajuste salarial a seus empregados. Nessa hipótese, sou a favor da medida, desde que bem discutida com os trabalhadores e que haja transparência integral sobre a sua necessidade, com prazo e patamares claros para uma nova discussão, que não é o que ocorre no tratamento com os servidores públicos federais.

Não é esse o caso do Serviço Público Federal (ou de outras esferas federativas), pois, pensamos que não estejamos com risco de continuidade da existência do Brasil. Isso somente aconteceria em caso de guerra externa com grande chance de derrota ou catástrofe natural que assolasse o País. Graças a Deus, não passamos por tais situações. Espera-se firmemente que, ano que vem e nos vindouros, ainda tenhamos o Brasil e os gabinetes, repartições e agências governamentais funcionando plenamente.

Senhor, finalmente, gostaria de deixar registrado que entendo que o que sai caro não é a máquina do Estado, mas sim a sua ineficiência, assim como a carga tributária em um país não é elevada e ruim por definição, em termos absolutos, mas sim a utilização dos recursos pelo Governo.

Infelizmente, em ambos os conceitos, é provável que a eficiência do serviço público e a utilização dos recursos tributários estejam deixando a desejar no Brasil.

É nisso que, no meu humilde entendimento, os nobres Deputados e Senadores deveriam ser mais atuantes, ao cobrar e propor medidas que garantissem a eficiência do serviço público (por exemplo, concordo até mesmo com a restrição à estabilidade do servidor público com base em transparentes, uniformes e objetivas medidas de desempenho, além de controles rígidos de entrega de resultados individuais e por equipes e cumprimento de prazos e horários contratados) e do uso dos recursos tributários (por exemplo, implementando medidas e metas de qualidade em todos os serviços públicos, vinculando-as a metas de arrecadação, não se permitindo majoração de impostos antes do atingimento de tais metas).

Tenho que informar que redigi esse texto em meu horário de almoço. Assim, peço desculpas por eventuais erros de ortografia, concordância ou estilo, pois não tive tempo para revisá-lo adequadamente.

Agradecido por sua estimada e valorosa atenção,
Despeço-me,
Atenciosamente,
Francisco das Chagas Nobre Santos
Cidadão, servidor público federal."

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