quarta-feira, 10 de setembro de 2014

(Pensamentos e Elucubrações): Porque não pega mais a ideia de Revolução Socialista no Brasil?


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É de se esperar que os partidários da ideia de Revolução Socialista irão discordar de mim. Alguns, menos propensos a aceitar discussões democráticas, quererão até dirigir-me ofensas de todo o tipo. 

O problema é que tal ideário vira uma religião para algumas pessoas e a religião muitas vezes cega a compreensão dos que a professam, tornando-as refratária a todo e qualquer pensamento que possa ir contra ou modificar o que se acredita, tendo em vista ser tão clara, tão lógica, tão única a sua visão que não há mais nada a se acrescentar nisso tudo. Todos que enxergam diferente só podem estar mal intencionados (na religião, possuídos por demônios, em partidos revolucionários socialistas radicais, a serviço do imperialismo, da burguesia ou dos patrões). 

E que seja anátema tudo e todos que pretendam ir além ou que possam incutir uma possibilidade diferente.



Tenho algumas ideias (nada inovadoras, diga-se de passagem) sobre a motivação pela qual o pensamento da Revolução Socialista não "pega" no Brasil atual, ou seja, porque se faz tanto barulho, mas não se consegue representatividade ou eco na população.

Novamente é de se esperar que a motivação recaia integralmente no poder econômico da burguesia que impede a divulgação clara dos pensamentos sociais revolucionários (voltando à questão religiosa, que nunca aceitará nada que possa macular a legitimidade e a beleza de sua visão). É claro que isso tem seu papel, mas não creio que seja o determinante do fracasso.

Já faz muito tempo que os ideias revolucionários são propostos (nos porões da repressão, há mais de um século), tendo se intensificado particularmente nos últimos dez anos, no mínimo. Com a fundação dos partidos políticos mais "radicais", o crescimento de movimentos combativos (estilo MST) e ainda com a disseminação da Internet e redes sociais, o acesso dos partidários às grandes massas nunca foi tão permitido e possível, mas, mesmo assim, a sua representatividade quase não se altera.

(E nem falo em representatividade no Legislativo de qualquer esfera, mas em uma pretensa e não aferida taxa de adesão das pessoas a tais ideias. Para tanto, bastaria sair às ruas, em diversas cidades e localidades, e, aleatoriamente, sem escolher o perfil do entrevistado, sinceramente e sem nenhum incentivo, perguntar ao povo que passa, apenas perguntar e pedir unicamente um simples sim ou não como resposta: "Você sabe o que é Revolução Socialista?", se sim, perguntar: "Você participaria de um movimento do tipo?").

Então, se a questão do poder econômico não explica totalmente o descaso popular com os ideias revolucionários, o que poderia explicar?

Para mim, a primeira questão é que os brasileiros (e não só os brasileiros, mas em diversos países do mundo, principalmente nos ditos emergentes) são cada vez mais patrão de si mesmo. Assim, um grande número dos novos empregos ou ocupações gerados nos últimos anos refere-se a microempresários ou autônomos e essas pessoas, uma massa muito considerável, não pensa como um assalariado "padrão", que normalmente gostaria de trabalhar o mínimo necessário e ganhar o máximo possível, ou seja, eles sabem das agruras de manter um negócio próprio, onde não há ninguém que mande neles (a não ser os clientes/fregueses), mas também não há ninguém para quem reclamar ou culpar (a não ser também os clientes/fregueses).

Em segundo lugar, os brasileiros assalariados pertencem, cada vez mais, ao setor de serviços e muitos ganham parte substancial de sua remuneração de forma variável, por comissões, participação em resultados, tarefas ou por projetos. Tais empregados são mais identificados com trabalhos intelectuais do que aqueles puramente braçais, como seria na antiga definição de operário, ou seja, suas atividades são menos repetitivas e dependem mais e mais de aperfeiçoamentos constantes. Este aperfeiçoamento é um patrimônio que ninguém tira do trabalhador, embora exija muitas horas adicionais de dedicação. Há um custo pessoal enorme, mas o valor adicionado ao trabalhador não se pode aferir pelas regras de antigamente. O operário, estritamente entendido, é, cada vez mais uma função não desejada, sendo uma parcela decrescente de trabalhadores, e tendendo a desaparecer no longo/longuíssimo prazo (mais de 50 anos).

O terceiro motivo é que os brasileiros (poderia até dizer que os seres humanos atuais, mais aqueles nascidos nos últimos 30 anos), principalmente (mas não exclusivamente) os assim posicionados nas hipóteses 1 e 2 acima, estão muito identificados (e desejosos), mesmo que inconscientemente, com a ideia de “ócio criativo” e não com prováveis lutas campesinas ou operárias. Esse ócio criativo não significa querer dormir até as onze da manhã, trabalhar cinco horas e voltar para casa para o lazer e novo descanso.

Trata-se na verdade, mais apropriadamente falando, de um ócio produtivo, um tempo em que não se está somente em busca de lucratividade ou vendas ou produção física (seja pretensamente para o próprio operário, na improvável "ditadura do proletariado", seja para o patrão, no "regime burguês"), mas em produção de ideias, em crescimento intelectual, em pesquisa básica ou aplicada, em busca de novas soluções a problemas de todo o tipo da sociedade ou das pessoas. 


Então, um sujeito que gaste a noite inteira nisso e siga virando o final de semana também nessa ocupação (entendendo-se esse ócio criativo como algo muito estimulante para o indivíduo, não somente aquilo que seja importante socialmente) não o está fazendo para ganhar mais horas-extras, adicional noturno, remuneração ou folgas dobradas, mas sim por uma realização pessoal. Só quem já passou pela situação ou é um privilegiado em ter tais momentos de ócio criativo pode saber como são boas tais situações. E cada vez mais há pessoas assim dedicadas ou desejosas de ter esse tempo.

A junção dos três fatores acima relatados, cada vez mais, cada vez mais, cada vez mais, tem significado uma pá de cal no ideário revolucionário no estilo “às armas companheiros”.


Assim, creio que, um partido que deseje assumir o poder, e trabalhar em conjunto com a sociedade e com as pessoas com vistas a realizar seus sonhos e aspirações, sempre entendendo que esses sonhos e aspirações acontecem dentro do individuo e na vida do individuo (não em uma abstração chamada “sociedade”, pois ninguém vive dentro da “sociedade”, entendendo-se que não somos formigas. As pessoas vivem de fato em seus corpos individuais, mas isso é um outro assunto), deve levar muito mais em consideração as três situações acima, lutando até para aumentar tal realidade, e cuidando para a melhor transição possível daqueles que ainda não conseguiram se adentrar em um dos novos perfis de trabalhador (muitos, de fato, não conseguirão, dado o prazo curto do restante de suas vidas. Então, deve-se minimizar os impactos dessa transformação a esses indivíduos) que, a longo prazo, tornará todos, de fato, empreendedores.

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