Li uma frase do Rubem Alves, na
orelha frontal de um de seus livros, que me instigou o pensamento. Não irei
dizer o nome do livro por agora, pois é uma fonte tão grande de ensinamentos, que
desejo (assumindo minha avareza em relação a isso) guarda-lo, por enquanto,
somente para mim (como se milhares de pessoas já não o conhecessem!), mesmo
porque ainda o estou lendo e me falta entende-lo e sorve-lo por completo.
Quando houver sugado sua seiva, apresentarei sua carcaça que, por se autorregenerar,
poderá ser sorvida novamente por muitos outros.
A frase assim dizia: “Será que
Deus fica feliz quando vê os seres humanos sofrendo?”
Tal pensamento resume toda uma
teologia que advogo para mim, embora, após anos de aprendizagem contrária, ainda
me vejo impossibilitado de a colocar em prática, na melhor tradução do “faça o que
eu digo, mas não faça o que eu faço”.
É isso. Ou seja, porque Deus seria feliz
com o sofrimento humano? Ou, Deus necessita de nosso sofrimento? Ou, se Deus é
amor, então o amor se alimenta de lágrimas e dores? Ou,...
Teria muitos questionamentos a fazer se
a primeira pergunta obtivesse resposta afirmativa. São indagações que nos
remete a uma imagem contraditória da divindade que sempre julgamos ser um poço
de bondades. Principalmente porque nunca associaríamos dores e sofrimentos à
ideia de bondade.
A pergunta inicial ocorre (como a
própria orelha do livro do Rubem Alves nos diz) quando observamos que, quando
desejamos ou necessitamos de algo que somente Deus nos pode conceder, sempre
prometemos em troca algo que nos é difícil, caro ou penoso fazer ou conceder,
atitude que nunca faríamos ou tentaríamos fazer em condições normais.
Ocorre que, em regras comerciais,
uma troca somente se dá quando as partes intercambiam coisas que ambas julgam de
igual intensidade de prazer ou felicidade. Então, para meu prazer e felicidade
eu compro um carro e dou em troca uma quantia monetária que proporcionará um
pequeno grau de prazer e felicidade em um grande número de pessoas (vendedor,
dono da loja, fabricante do veículo, operários que o fabrica, etc.) o qual, se somados,
equivalem ao meu prazer e felicidade ao comprar o carro. E é assim que se
operam os relacionamentos humanos legítimos (excluindo-se os de dominação pela
força, logicamente).
Então, se para nos conceder um
favor, Deus nos exige uma dor ou perda, é justo pensar que Deus se apraz disso
na mesma intensidade com que nos aprazeria receber o favor!
Os crentes e religiosos
incondicionais teriam uma simples explicação para tal. Eles apenas nos dizem que
não temos conhecimento dos verdadeiros desígnios de Deus, que não se apraz com
nosso sofrimento, mas vê muito à frente e sabe que a nossa decisão de se abster
de um prazer nos trará benefícios no futuro. Assim, sem sabermos estamos
obtendo dois benefícios com uma só atitude.
Mas, porque somente nossas
atitudes prazerosas poderiam gerar problemas futuros? Porque o abandono de algo
que já causa desconforto não poderia ser utilizado como moeda de troca?
Por exemplo, por que não “prometo
abandonar esse emprego que odeio se o Senhor me conceder a cura dessa gastrite
que tanto me incomoda”, ao invés de “prometo parar de sair às noites de sexta
com os amigos se o Senhor me conceder a cura dessa gastrite que tanto me
incomoda”?
E quem nos fez pensar que o que
nos dá prazer é profano e ruim, sempre, e somente a dor e o sofrimento nos
levam para próximo da divindade?
Penso que foram pessoas com algum grau
de psicose, pessoas com baixa autoestima e com significativo complexo de
inferioridade, mas com grande capacidade de convencimento de massas, os quais,
principalmente em momentos de carestia, conseguiram tirar seus grupos de
situações de penúria ou extermínio galopante com pensamentos e atitudes austeras,
frugais e proibitivas.
Como a humanidade passou por mais
momentos de penúria do que de fartura, é fácil saber por que a ideia do prazer
é tida como destrutiva e má, e o pensamento de austeridade é visto como
edificante e pio.
E foi tal pensamento que conduziu
a igreja Católica a instituir o seu rol de pecados, mesmo que Jesus afirmasse
que a única coisa a que nos deveríamos obrigar seria amar ao próximo como a nós
mesmos.
Esse post irá possibilitar que eu possa falar sobre esses pretensos
pecados e porque os tais talvez não devessem ser considerados tão abomináveis.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Pode falar :)